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segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Teologia Ambiental – Providência como Preservação


Por Marcos Porto

É impossível abordar o tema da Teologia Ambiental sem mencionar a questão da providência divina e a responsabilidade de preservação da criação que esta nos impõe. Acerca disto, faremos uso da obra de Erickson, teólogo sistemático cujos ensinos continuam atuais, para ele se a criação é a obra geradora de Deus em relação ao universo, a providência é seu relacionamento contínuo com este. Por providência entenda-se a ação contínua dele pela qual preserva a existência da criação por Ele realizada e a dirige para os propósitos que designou para ela. Do latim providere que, literalmente, significa prever. Porém, envolve mais que o mero conhecimento do futuro. Traz a conotação de agir com prudência ou fazer preparativos para o futuro. É central para a condução da vida cristã. Logo, somos capazes de viver na certeza de que Deus está presente e ativo em nossa vida. Vivemos sob seus cuidados e, portanto, podemos encarar o futuro de forma confiante, sabendo que as coisas não acontecem por mero acaso. Podemos orar, sabendo que Deus ouve e age de acordo com sua vontade e atende às nossas orações. Podemos enfrentar o perigo, sabendo que ele não está alheio, despreocupado[1].
Há dois aspectos sob os se deve observar a providência. Um é a obra divina para preservar a existência de sua criação, sustentando-a e mantendo-a; isso em geral é denominado preservação ou sustento. O outro é a atividade divina que guia e dirige o curso dos acontecimentos para que cumpram o propósito que ele tem em mente. Isso é denominado governo ou providência propriamente dita. A preservação e o governo não devem ser tratados como atos totalmente separados de Deus, mas como aspectos distintos de sua obra única[2]. Abordaremos apenas o primeiro aspecto.
A Bíblia aborda, em várias passagens, o tema de que Deus preserva sua criação como um todo. Em Neemias 9.6, recebemos de Esdras a seguinte constatação “Só tu és SENHOR; tu fizeste o céu, o céu dos céus, e todo o seu exército, a terra e tudo quanto nela há, os mares e tudo quanto neles há, e tu os guardas com vida a todos; e o exército dos céus te adora”. Ainda no Antigo Testamento, no Salmo 104 vemos um relato da criação e do cuidado de Deus em provê-la, sob o aspecto do entendimento dos salmistas. Ordenas a escuridão, e faz-se noite, na qual saem todos os animais da selva. Os leõezinhos bramam pela presa, e de Deus buscam o seu sustento[3].
Quanto ao Novo testamento, tanto Paulo na carta aos Colossenses como o autor de Hebreus afirmam que Cristo participa tanto na Criação de tudo como na continuidade dela “E ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por ele. Colossenses 1:17” e “O qual, sendo o resplendor da sua glória, e a expressa imagem da sua pessoa, e sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder, havendo feito por si mesmo a purificação dos nossos pecados, assentou-se à destra da majestade nas alturas. Hebreus 1:3”. Isto nos leva a afirmar que a os autores das Escrituras enxergam a mão preservadora de Deus em todo o lugar.
Agora a questão que resta é qual o papel da humanidade nisto? Para tanto, devemos nos remeter a mesma Doutrina da Criação que originou o início deste artigo, mais especificamente na parte em que ela aborda o significado teológico da criação humana por Deus. Com esta porção da teologia sistemática, podemos aprender:
O fato de o ser humano ter sido criado significa que não possui existência independente. Ganhou vida porque Deus assim desejou que existissem e agiu para trazê-los à existência. Isso nos devia fazer perguntar o motivo de nossa existência. Como não existiríamos sem sua Vontade, devemos tudo o que somos e temos a ele;
Os seres humanos fazem parte da criação. Mesmo sendo completamente diferentes dos outros seres, não são distintos deles a ponto de não terem nenhuma relação com os mesmos. São participantes da sequência da criação do mesmo modo que os outros seres. Ao inserir a humanidade em um dos dias da criação relatados no Gênesis, os liga de forma cabal a todos os seres criados por Deus. Isso nos indica que deve haver harmonia entre os seres humanos e as outras criaturas.
Essa afinidade, se observada de maneira séria, tem um impacto definido sobre nossa relação como todo o mundo. A ecologia, então, encontra sua relação com a teologia e este termo passa a ter seu significado ampliado. Ela deriva de oikos, “casa”. Isto denota a ideia de uma grande família da qual fazemos parte e em cuja qual, todas as atitudes da humanidade influenciam a vida de todos os outros, verdade dolorosamente clara que podemos perceber com a crescente poluição, desmatamento, extinção de espécies e outros danos ao planeta, a despeito de toda preocupação com o meio ambiente atualmente.
E por fim, se considerarmos os versículos 28-30 de Gênesis 1:
“E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre a terra. E disse Deus: Eis que vos tenho dado toda a erva que dê semente, que está sobre a face de toda a terra; e toda a árvore, em que há fruto que dê semente, ser-vos-á para mantimento. E a todo o animal da terra, e a toda a ave dos céus, e a todo o réptil da terra, em que há alma vivente, toda a erva verde será para mantimento; e assim foi. E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom; e foi a tarde e a manhã, o dia sexto”.

A manutenção da existência e perfeição da Criação recai sobre o mesmo ser humano que recebe a ordem divina de sujeitar e dominar sobre a terra. Entretanto, A expressão do Gênesis “dominai a terra” é que teria sustentado a postura de devastação sob a desculpa de progresso que levou à crise ecológica. Renan Dall’ Agnol e Dr Leomar Brustolin, realizaram um pesquisa para verificar como esse versículo bíblico possibilita tanto a ética do cuidado, quanto a exploração natural além de apresentarem os aspectos teológicos que promovam a ética do cuidado, indispensável perante os problemas ecológicos atuais e vindouros. Neste sentido, a teologia ambiental busca restituir o simbolismo exegético do relato da criação para propor o cuidado pelo cosmos, no qual o ser humano não é dono e sim criatura verdadeiramente livre e responsável pelo mesmo[4].

Bibliografia:

AGNOLL, Renan Dall’. e BRUSTOLIN, Leomar Antônio. Salvar a terra: a contribuição da Teologia para a ética do cuidado na ecologia. Faculdade de Teologia, PUCRS. X Salão de Iniciação Científica PUCRS.
BOFF, Leonardo. Ecologia – Grito da Terra, Grito dos Pobres. São Paulo: Ática, 1999.
ERICKSON, Millard. Introdução à Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova , 1997.
MOLTMANN, Jürgen. Deus na Criação: Doutrina Ecológica da Criação. Petrópolis: Vozes, 1993.
SILVA, Vanusa de Oliveira. E AGOSTINI, NiloÉtica Ambiental: uma análise de integração “Deus-ser humano-natureza”. Acessado em Junho de 2012. Disponível em http://www.puc-rio.br/pibic/relatorio_resumo2006/Resumo 2006/CTCH/TEO-OK/Vanusa de Oliveira Silva.pdf
http://marciorosa.wordpress.com/2008/03/01/por-uma-teologia-ambiental
http://www.metodista.br/fateo/noticias/compromisso-com-o-meio-ambiente-faculdade-de-teologia-da-inicio-a-projeto-ambiental


[1] ERICKSON, Millard. Introdução à Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova , 1997. p.169-170.
[2] ERICKSON, Millard. Introdução à Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova , 1997. p. 170.
[3] Salmos 104.20-21.
[4] AGNOLL, Renan D. BRUSTOLIN, L. A. Salvar a terra: a contribuição da Teologia para a ética do cuidado na ecologia. Faculdade de Teologia, PUCRS. X Salão de Iniciação Científica PUCRS.